O fenômeno da Deriva: Soja versus Parreirais
- CSP LAW
- 14 de mai. de 2021
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O fenômeno da deriva surge quando da aplicação de defensivos agrícolas, de forma que o composto químico deixa de atingir somente o local de sua aplicação, passando a atingir propriedades lindeiras através da evaporação e, principalmente, através do deslocamento do produto por meio do vento.
As dores de cabeça trazidas pelo fenômeno vem se tornado cada vez mais costumeiras nas áreas cujo plantio de soja seja realizado nas cercanias de parreirais, mormente quando da aplicação do herbicida hormonal com a presença do composto químico ácido 2,4-diclorofenoxiacético (2,4-D) no combate à planta daninha/buva.
A Secretária da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural do Estado do Rio Grande do Sul - SEAPDR/RS - no âmbito das suas atribuições regulamenta a forma de aplicação do herbicida através da Instrução Normativa n.º 06 de 05/07/2019, estabelecendo que esta deve ser realizada por indivíduo que tenha concluído o curso de boas práticas agrícolas na aplicação de agrotóxicos perante o SENAR, devendo este ainda dispor de cadastro junto ao registro estadual de aplicador de agrotóxico.
Já a Instrução Normativa SEAPDR n° 05/2019 dispõe acerca do Termo de Conhecimento de Risco e de Responsabilidade, estabelecendo que o produtor rural somente poderá realizar a aplicação do herbicida nas seguintes condições meteorológicas: a) velocidade do vento menor que 10 KM/h; b) umidade relativa do ar superior a 55%; c) temperatura ambiente menor do que 30ºC; podendo haver exceções no caso de recomendações específicas da bula do produto.
Independentemente do cumprimento ou não das regulamentações impostas pela Secretaria de Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul, em alguns casos, esta situação tem criado um verdadeiro embate entre produtores de soja e os produtores de uvas/oliveiras, uma vez que os produtores da cultura permanente reclamam acerca da diminuição de sua produção em razão do ressecamento dos parreirais ou dos olivais, gerando, em casos extremos, a perda total do investimento realizado.
O direito enxerga toda esta situação enquadrada no âmbito do conflito de direitos de vizinhança, já que a partir de um ato lícito, surgem repercussões no imóvel vizinho, causando-lhe incômodos e prejuízos.
A legislação, por sua vez, determina que o proprietário ou possuidor de um imóvel não pode exercer o seu direito de propriedade de forma que venha a ser ‘prejudicada a segurança, o sossego e a saúde dos que habitam nas propriedades vizinhas, podendo as mais variadas condutas caracterizarem uso anormal da propriedade e, então, configurar atos abusivos ou excessivos.
A responsabilização poderá ocorrer em relação aquele que realiza o uso anormal da propriedade, devendo responder pelos danos independentemente de culpa. Ainda, o uso anormal da propriedade divide-se em: a) Uso normal da propriedade, causando incômodos anormais, mas socialmente necessários (dano ilícito oriundo de ato lícito); b) Uso anormal, causando danos anormais, inexistindo interesse coletivo na atividade (dano ilícito oriundo de ato ilícito).
A diferenciação entre a classificação das condutas gera diferentes consequências jurídicas, de modo que para circunstâncias envolvendo o uso normal da propriedade que venha a causar danos anormais, a medida jurídica visará REDUZIR os efeitos da(s) externalidade(s) negativa(s) através de obras, troca de produtos, ou de qualquer outra medida que assegure o resultado prático equivalente, delimitando-se, ainda, uma sanção para o caso de descumprimento.
Já o uso anormal que venha a causa danos anormais possui consequências mais severas, quais sejam, a própria cessação quanto ao uso e/ou desenvolvimento da atividade.
Entende-se que a melhor solução para este impasse é a costura de um acordo entre os envolvidos, o qual deverá atentar-se à conceituação do problema do custo social sugerido por Ronald Coase mediante a verificação de qual das partes possui o menor ônus de arcar com as medidas cujo custo marginal da responsabilização seja o mais aproximado da escala zero.
Contudo, nem sempre um acordo é possível, fazendo-se necessária a propositura de demanda judicial através da qual se objetivará a inibição quanto à prática e/ou reiteração do ato ilícito, sem se olvidar da tutela inibitória, pleito de danos patrimoniais e morais em relação aos atos praticados antes da efetivação da medida coercitiva e do dano infecto, solicitando-se, por fim, caução idônea e suficiente como garantia de futuras e eventuais indenizações.
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